16 de outubro de 2007

 

Pontadas

Pontes romanas já não há muitas e, como se isso não bastasse, as que temos vão sendo adulteradas. A Ponte de Segura sobre o Rio Erges (Idanha-a-Nova), onde ainda hoje se passa de automóvel entre Portugal e Espanha, recebeu umas sapatas de cimento durante as recentes obras de beneficiação lançadas pela empresa Estradas de Portugal.
A estrutura romana sobreviveu a séculos de danos, em que os mais graves obrigaram à reconstrução do tabuleiro, no século XVII. Mas no século XXI parece não ter havido clarividência para evitar cobri-la com cimento, indispensável nas obras modernas, mas um “veneno” que corrói a pedra das construções antigas, segundo José Afonso, director regional do ex-Instituto Português do Património Arquitectónico (IGESPAR). Hoje cimentamos uma ponte romana, no futuro alguém achará melhor reparar Conimbriga com betão e civilizações que nos sucedam vão achar que os Jerónimos também ficam melhor com cimento. Ah, talvez não, porque são monumentos classificados. Coisa que a Ponte de Segura não é.
Segundo José Afonso, é difícil classificar a ponte, porque é preciso reunir uma série de entidades dos dois países! Há 30 anos atrás talvez assim fosse. Hoje, numa madura União Europeia, mais parece que ainda não houve foi vontade política que se preocupasse a sério com o assunto. Além do mais, o facto de o património não estar classificado não justifica que esqueça a cidadania e não se oiça quem deve (como o IPPAR).
Mas, por outro lado, já alguém tinha ouvido falar da ponte romana de Segura antes deste episódio (que foi manchete de segunda-feira no Diário XXI)? Onde está o turismo cultural, o interesse pelo património, a valorização de um bem secular - como são Conimbriga e os Jerónimos? As sapatas de cimento não lhe ficam bem, mas o desprezo da comunidade para com estas obras também não ajuda.
Luís Fonseca


A “questão” da ponte luso-espanhola de Segura continua a provocar e a levantar várias atitudes, comentários e interrogações. Desde logo, há já algo de muito positivo no despoletar da difusão da notícia da danosa intervenção a que a ponte se sujeitou: a ponte romana de Segura deixou de ser uma ilustre desconhecida para alguns que se consideram grandes ‘especialistas do património regional.

Foi um ganho substantivo. Por outro lado, identificou-se a completa descoordenação e desgoverno entre a administração local e administração central a que o património da Beira Interior está sujeito. A palavra é mesmo esta - desgoverno. Repetimos: No âmbito da defesa e da preservação do património construído na Beira há um completo desgoverno! E no resto do País?

Neste caso, alguns dirão olha, olha, a ponte é internacional, logo a culpa também é dos espanhóis. É verdade! O descuido também foi da administração espanhola, da Junta da Extremadura. Não deixa de ser estranho, nomeadamente no concelho de Idanha-a-Nova, com tanta e tanta ‘cooperacion’ (com subsídio, sem subsídio, institucional, indivídual, de dia, de noite…) que, nas últimas décadas, por aqui tem acontecido. Com tanta gentinha a cooperar na cultura, no artesanato, na arqueologia, na economia, na geologia, na arte, na gastronomia, etc, etc, nunca ninguém se lembrou da Ponte de Segura, quer quanto ao seu valor patrimonial , quer quanto ao seu valor turístico? Sim, claro. Alguns (poucos) lembraram-se. Por exemplo, e entre outros, o arqueólogo da Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, José Cristóvão num trabalho sobre as pontes romanas do concelho, publicado num número da revista Adufe. Também, e temos constância disso, a ponte e a sua musealização, foram abordadas, em 1998, em Cória, numas jornadas sobre o património raiano a que assistiram e participaram vários técnicos e políticos da região. Um destes dias, recordaremos, alguns desses eventos de ‘cooperacion’ patrimonial. Por outro lado, a ponte de Segura possui um referencial bibliográfico considerável consultável por qualquer pessoa que se dedique a estes assuntos. São dezenas de títulos onde o monumento se encontra referenciado. Daí ser de estranhar o autêntico deserto que é a sua presença no Endovélico, do Instituto Português de Arqueologia.
Ora este facto impossibilita qualquer atitude de descoberta da ponte, como andam por aí algusn a dizer..

Sejamos justos e honestos. A Câmara do nosso Concelho tem feito um notável esforço e investimento na divulgação das nossas riquezas culturais. A defesa do património é uma batalha continuada e firme. E isto da ponte, é claro que incomodará muita gente do executivo. Não foi a melhor solução ao nível de preservação patrimonial. Os especialistas que se pronunciem. MAS , atenção. A ponte de Segura estava em iminência de cair. Isto é que a verdade.

Já a atitude manifestada ao Diário XXI pelo Director do Igespar, o arquitecto José Afonso, é que é de estranhar.

Contactado pelo Diário XXI, o director regional do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico (IGESPAR), José Afonso, considerou “gravosa” a intervenção, mas lembrou que a instituição que dirige não tem competência para impedir os trabalhos. “A Ponte Internacional de Segura está sob a alçada do Instituto de Estradas de Portugal e da congénere espanhola”, disse o responsável, que acrescenta: “A ponte não está classificada, não obstante de ser uma construção romana”. “O processo de classificação é muito, muito complicado por envolver dois países”, explicou.
José Afonso promete levar o caso às instâncias superiores do IGESPAR. “Vou levar o caso à direcção do IGESPAR, mas tenho a consciência de que pouco poderemos fazer, visto que o monumento não está classificado”, concluiu.

Pois é. Para quem anda tão ocupado, e bem, com o património ‘eurístico-turístico, o património não classificado é outra coisa. E depois essa coisa das competências. Daqui a pouco estamos a perguntar afinal para que é que serve? Olhe dê, ou mande dar aos seus técnicos, um salto até à aldeia de Segura, principalmente à sua zona histórica que é centralizada pelo pelourinho manuelino ou aos vestígios da fortaleza raiana que antigamente dominava a aldeia. Hoje são os mamarrachos que a dominam.

Aqui fica o regime de protecção não vá o restauro do cimento continuar.

Protecção

IIP, Dec. nº 23 122, DG 231 de 11 Outubro 1933

Protecção

IIP, Dec. nº 42 255, DG 105 de 08 Maio 1959

Os “passeios turísticos”ao longo da A23 são mais rápidos ou as reuniões das rotas são mais aliciantes e frescas. Afinal Segura fica longe. Pois é, pois é.

PS: Bem haja jornalista Luís Fonseca pelo pertinente editorial.

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Reparação de ponte romana com cimento é “grave”


O director regional da delegação de Castelo Branco do ex-IPPAR classificou como “muito grave” a reparação com cimento de uma ponte romana na região.

A Ponte de Segura (concelho de Idanha-a-Nova) mantém a estrutura base de origem romana, apesar do tabuleiro já ter sido reconstruído séculos depois. Em declarações à agência Lusa, o director do ex-Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), José Afonso, referiu que a ponte liga Portugal e Espanha sobre o Rio Erges e “é gerida pela empresa Estradas de Portugal, responsável pela obra de reabilitação e reforço estrutural da estrutura”.
“Foi feito o revestimento de algumas sapatas com cimento, que é o maior veneno do património, da arquitectura e construção tradicional. É um processo irreversível. Aliás, em contacto com a humidade ou chuvas, forma um ácido que ataca a pedra”, lamentou.
Segundo aquele responsável, devia ser usado “o mesmo tipo de cimento que era fabricado pelos romanos”, mantendo os materiais ancestrais. “Trata-se de património importante, só que não está classificado. É uma ponte internacional e para a classificar é preciso envolver entidades dos dois países, o que tem representado alguma dificuldade”, explicou José Afonso.
De acordo com o responsável, “ao não estar classificada, legalmente não é necessário haver comunicação ao Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) para intervir naquela construção romana”. “Mas devia haver prudência, sentido de responsabilidade e cidadania da parte dos técnicos no sentido de cuidar bem de uma ponte que, independentemente de estar classificada ou não, é património histórico de todos”, sublinha.
José Afonso admite que outros casos semelhantes possam ocorrer, porque, “em Portugal, os técnicos envolvidos nestes trabalhos continuam a agir sem sentido de responsabilidade”. Por outro lado, “a legislação nestes casos devia ser mais simples e o Estado devia actuar mais depressa quando se detectam os problemas”.
Sem formas legais de actuar, José Afonso considera importante lançar o alerta sobre a situação. “Acho que a própria Estradas de Portugal já foi alertada e está a par do problema”, refere. Apesar das diversas tentativas, a Agência Lusa não conseguiu obter esclarecimentos da Estradas de Portugal.
 
http://ml.ci.uc.pt/mhonarchive/archport/msg02136.html
 
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